Publicado em 14 de junho de 2024
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STF decide que saldo do FGTS será corrigido pela inflação oficial

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, nesta quarta-feira (12), que a remuneração do saldo das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) serão corrigidos, a partir de agora, pela inflação oficial do país, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

A maioria da Corte (7 votos a 4) se guiou pelo voto médio (que combina parcialmente os votos) e estabeleceu que a remuneração ainda será vinculada à Taxa Referencial (TR), mais 3%, com a garantia de ganho da inflação medida pelo IPCA. Além disso, definiu que a decisão não terá retroatividade.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5090), impetrada pelo partido Solidariedade, questionava a aplicação da TR para remuneração do saldo do fundo. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, defendeu a procedência e foi seguido por André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin. O ministro Cristiano Zanin, que tinha pedido vista, achou que é improcedente e foi seguido por Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Já Flávio Dino e Luís Fux votaram como parcialmente procedente. Mesmo com a divergência, todos os ministros concordaram em dois pontos: eles defendem a função social do FGTS e que qualquer decisão não seja retroativa, passando a valer apenas para o período pós decisão ou só em 2025.

Recursos do FGTS

Os recursos do FGTS são utilizados para fins sociais relevantes, como financiamento habitacional, saneamento e infraestrutura urbana. Por isso, o presidente do STF entendeu que não é razoável impor a um grupo vulnerável da população o custo integral de uma política pública de interesse coletivo sem assegurar, em contrapartida, uma remuneração justa. Em seu voto, o relator também estabeleceu que a nova regra só produziria efeitos para depósitos efetuados, a partir de 2025.

Dino ainda considerou que o FGTS não pode ter remuneração igual a um investimento de mercado financeiro, porque, caso se remunere os depósitos de modo mais elevado, o resultado, segundo ele, será o encarecimento da linha de crédito.

Criado em 1966, o FGTS visa garantir a formação de uma reserva financeira para proteger os trabalhadores demitidos sem justa causa. Os valores são depositados mensalmente pelo empregador numa conta bancária aberta em nome do empregado e vinculada ao contrato de trabalho, e podem ser sacados após a rescisão ou em algumas situações específicas, como a compra da casa própria. A TR, por sua vez, é uma taxa de juros de referência para a atualização monetária de algumas operações de crédito e aplicações financeiras.

Com as Leis 8.036/1990 e 8.177/1991, a taxa passou a ser referência para a correção dos depósitos no fundo. Hoje, a rentabilidade do FGTS é de 3% ao ano, mais a variação da TR. Assim, o aumento ou a queda da taxa tem impacto no saldo das contas do FGTS.

Políticas públicas

De outro lado, a União defende que, além de ser patrimônio do trabalhador, o FGTS é um importante instrumento para a concretização de políticas de interesse de toda sociedade. Assim, aumentar o índice de correção reduziria a possibilidade de financiamento de obras de saneamento básico, infraestrutura urbana e habitação com recursos do fundo.

Além disso, a Advocacia-Geral da União (AGU) estimou que a mudança teria um impacto de R$ 19,9 bilhões em seis anos, se a remuneração do FGTS passasse a ser feita pelas taxas da poupança.

Defasagem

Na ação, o Solidariedade sustentou que a TR está defasada em relação ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) e IPCA, que medem a inflação oficial no país. O partido argumenta que a TR não é um índice de correção monetária e que a atual fórmula gera perdas aos trabalhadores, uma vez que os saldos não acompanham a inflação. Assim, pediu a declaração de inconstitucionalidade da aplicação da TR aos depósitos do FGTS.

Julgamento

A ação começou a ser julgada em abril de 2023. Até esta quarta-feira, eram três votos para assegurar que o conjunto da remuneração do FGTS fosse, no mínimo, igual ao da caderneta de poupança. A remuneração desse investimento, hoje, é calculada de acordo com o patamar da taxa básica de juros da economia, a Selic, podendo ser de 0,5% mais a variação da TR (se a Selic estiver acima de 8,5% ao ano) ou equivalente a 70% da Selic mais a variação da TR (se a Selic estiver igual ou abaixo de 8,5% ao ano).

Essa proposta foi apresentada no voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso (presidente do STF). Barroso explicou que o FGTS é uma espécie de aplicação financeira obrigatória com remuneração extremamente baixa, muito inferior à dos investimentos mais conservadores. Ele citou o exemplo da caderneta de poupança, que, mesmo apresentando menores riscos e cujos valores podem ser sacados com mais facilidade, tem rendimento muito superior. Portanto, ao seu ver, os depósitos do fundo não podem receber correção inferior à da poupança.

Prejuízo ao financiamento imobiliário

Na visão do Bradesco BBI, qualquer aumento na remuneração do FGTS seria prejudicial ao segmento imobiliário porque afetaria as empresas do setor listadas em bolsa, como Tenda (TEND3), Cury (CURY3), Plano&Plano (PLPL3), MRV (MRVE3) e Direcional (DIRR3). Isso porque reduziria a flexibilidade para originar financiamentos e até mesmo para manter o FGTS sustentável.

O que dizem os advogados?

Segundo Sergio Pelcerman, sócio da área trabalhista do Almeida Prado & Hoffmann advogados, a forte controvérsia envolvendo o assunto decorre justamente sobre a função social que o FGTS tem, por um lado, e a defasagem da simples atualização pela TR, que corrói o patrimônio do trabalhador por não repor as perdas inflacionárias.

“Como se trata de aspecto aplicável à totalidade dos empregados registrados nos moldes das regras da CLT, a atualização impactará as contas vinculadas de FGTS, gerando impacto ao governo e a vários os setores”, disse o advogado, frisando que a redução dos percentuais do índice TR não tem sido capaz de compensar as perdas monetárias decorrentes da inflação.

Para Gustavo Rodrigues Silva, advogado tributarista no Ballstaedt Gasparino Advogados, garantir a remuneração da inflação como correção do fundo dá ao trabalhador duas formas de ganho, conforme a Selic, que é a taxa básica de juros da economia e a recomposição da perda inflacionária.

Ao garantir que não haverá retroatividade, o STF também evita prejuízos maiores também nas contas do governo, segundo Priscilla Simonato, advogada, professora de Direito do Trabalho e Previdenciário e sócia do escritório Simonato Advogados. “Assim, a nova forma de reajuste valerá apenas para os depósitos realizados a partir de 2025”.

 
 
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